Esgotamento capital








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O burnout na era do capitalismo tecnológico

1- Nunca estivemos tão vulneráveis ao burnout como agora. É cada vez mais normal conhecer pelo menos um caso de alguém que nos é próximo e que enfrenta um esgotamento nervoso; é cada vez mais normal observar esta doença em pessoas jovens.

2- Num mundo que acelera a passos largos, exigindo à classe trabalhadora cada vez mais do seu tempo, não podemos fugir ao debate dos efeitos nefastos do capitalismo tardio na saúde mental. O esgotamento mental, mais conhecido pela expressão inglesa burnout, é por muitos considerado uma epidemia do século XXI.

3- Convivemos com a banalização da cultura do trabalho até à última num período da história onde as nossas condições de vida se vão degradando com o passar dos dias. O mercado de trabalho não nos oferece uma perspetiva de futuro, os salários não acompanham a crescente inflação, a crise da habitação prende-nos à casa dos nossos pais e as universidades vão cooptando os moldes do mercado de trabalho – aumento da carga horária, exigências desmedidas e poucas promessas de segurança quando acabar.

4- Quem entra agora para o mercado de trabalho são jovens que cresceram a ver a sua promessa de futuro a ser roubada do seu alcance pela ganância de uma elite económica que apenas pensa em acumular capital. Chegamos ao mercado de trabalho já sem esperança de estarmos ali para podermos ter uma vida melhor que os nossos pais, pois o que nos chegou às mãos foi uma sociedade destruída pelos governos neoliberais.

5- O capitalismo precisa do esgotamento da classe trabalhadora para poder garantir que tem como continuar a produzir desenfreadamente, mesmo que toda esta produção não chegue a todas as pessoas de forma igual. Nunca se produziu tanto a troco de tão pouco; nunca se produziu tanto, mas as desigualdades não diminuem por nada.

6- Dizem-nos os liberais que só é preciso trabalharmos mais que quem nos rodeia, sermos os melhores na nossa área, os melhores no nosso trabalho. Escrevem-se publicações em redes sociais como o LinkedIn ou o X que nos atiram à cara que alguém está sempre disposto a ir mais além para conseguir uma mísera promoção que em nada lhe garante uma digna remuneração.

7- O aumento da jornada laboral isola-nos da nossa comunidade. Temos cada vez menos tempo para a nossa família, para os nossos amigos, para os nossos passatempos e, consequentemente, para nós. Ao sermos consumidos pela monotonia da vida automatizada que nos é imposta ficamos mais vulneráveis e o declínio da saúde mental nos últimos 15 anos é a prova disso.

8- Não, nós não queremos viver para servir quem não nos serve! O trabalho não deve ser o centro da vida de nenhuma pessoa, muito menos o trabalho excessivo e que prejudica a qualidade de vida; o trabalho deve ser um meio para conseguirmos viver e que nos ajude a criar uma sociedade que dê prioridade ao bem estar coletivo. Quando a minha geração fala de não querer morrer a trabalhar não faltam críticas de quem se acostumou a ser um servo do grande capital, mas nós vamos quebrar o ciclo.

9- Podemos considerar que está a nascer uma onda de descontentamento geral com a forma como nos é apresentado o conceito de trabalho. Surgem modas entre os jovens que são o espelho disso como é o caso do quiet quitting- apenas fazer o que é estritamente necessário para conseguir manter o emprego, podendo mesmo vir a diminuir a quantidade de trabalho feito. Mesmo com a ascensão do conservadorismo entre pessoas mais jovens vemos, em paralelo, o crescimento de uma consciência coletiva de que a nossa vida não pode ser mais que isto.

10- Cabe às nossas gerações assegurar o combate pela construção do nosso mundo novo. Enfrentamos a queda dos governos neoliberais e assistimos à distopia que é o capitalismo tardio, mas não vemos isto impávidos e conformados. Levemos a nossa inquietação para as ruas, para as organizações onde nos inserimos, para os espaços onde existimos. Como já dizia um senhor de barbas brancas: não temos nada a perder a não ser as nossas correntes. Temos um mundo para ganhar!